Infância

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terça-feira, 15 de julho de 2008

Esquizofrenia



Não costumo escrever sobre questões políticas. Mesmo sabendo que o próprio ato de escrever já se constitui em atitude política. Forçada. Conceitual. Subliminar. Inconsciente. Sou daqueles seres humanos quietinhos que ficam ainda mais pequeninos quando o assunto é política, religião e futebol.

Fui candidato apenas uma vez – época da universidade – porque me convenceram de que eu era a pessoa ideal para assumir a secretaria de cultura do diretório acadêmico. E – principalmente! – teria liberdade para desenvolver meu trabalho longe da mesquinhez, sombra poderosa que nos acompanha enquanto administradores do bem público. Bobagem. Consciência tardia. Depois da vitória é que percebi que nem mesmo os artistas escapolem daquela gente, de estrutura perversa, capaz de tudo para alcançar e permanecer no poder.

Por que então romper o silêncio depois de tantos anos? Muito simples – ou por demais complexo! -. Se até recentemente a esfericidade do comportamento humano, metaforizado por medos, angústias e desejos representavam para mim uma espécie de pulsão – que não era de vida e muito menos de morte -, disparador do que a intelectualidade mambembe rejeita e chama de inspiração, hoje – grito em confissão! -, a entrevista de “respeitadíssimo” político piauiense para um programa de televisão local desencadeou uma revolução violenta em meus pensamentos e princípios. Se não atirei pedras no aparelho de tevê foi porque o notebook também estava ao alcance das mãos.

Que a polícia federal tem trabalhado bastante é um fato. Que nossos “homens ricos” têm dado bastante trabalho para a polícia federal também é um fato. E de fato o que se percebe é que a corrupção vem se tornando – agora é oficial! – o principal crime federal e estadual e municipal e, acrescentemos, visceral. O banqueiro Daniel Dantas foi preso. Foi solto. Foi preso. Foi solto. Comentário do senador piauiense: se ele é bandido, pelo menos é um bandido que gera emprego e renda. Comentário do senador piauiense: as atitudes do delegado que investiga o caso são atitudes esquizofrênicas.

De acordo com a CID-10, “os transtornos esquizofrênicos são caracterizados, em geral, por distorções fundamentais e características do pensamento e da percepção e por afeto inadequado ou embotado”. Mais adiante: “Dessa forma, o pensamento se torna vago, elíptico e obscuro e sua expressão em palavras, algumas vezes incompreensível”. O Aurélio também esclarece: “a esquizofrenia é uma afecção mental caracterizada pelo relaxamento das formas usuais de associação de idéias, baixa afetividade, autismo e perda de contato vital com a realidade”.

Perda de contato vital com a realidade! Tadinho do delegado e de todos nós. Daqui a pouco surge um novo Simão Bacamarte (peço ao leitor que entre em contato com a obra O Alienista, de Machado de Assis) e o Brasil, transformado em hospício, internará aqueles que não se sujeitam à enganação. O raciocínio será o seguinte: se os corruptos correspondem à maioria, ser corrupto é ser normal.

Louco é o juiz que manda prender. É o delegado que investiga. É o homem que exige os seus direitos. É o telespectador que não se deixa ludibriar. É o repórter que denuncia e por isso mesmo será processado. Loucura é invadir a casa do senhor Celso Pitta e filmar toda a operação. É não aceitar suborno. É algemar banqueiros e empresários. É deixar de lado a ficção e a criação de personagens – bem mais humanos! – para desabafar.