Infância

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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O Teatro no Brasil


Não participo de uma produção teatral há alguns anos. Ando meio manco e desiludido. Pela primeira vez a ignorância de meu pai – “trabalhar de graça é perda de tempo, pagar para trabalhar é burrice” – parece fazer sentido. Não pelo trabalho em si. Mas pelo trabalho que dá, e acredito que não seja apenas no Piauí, convencer empresários e fundações (anti) culturais a investir em projetos artísticos. O resultado: montagens medíocres. A fatalidade: um público desconfiado. A realidade (?): maravilhosos são os espetáculos com atores globais. A indignação: ais, suspiros, ais.

É que o teatro no Brasil já surgiu deformado. Uma desfiguração só. Doutrinário. Coube à Companhia de Jesus transformar peças teatrais em instrumentos de educação e catequese. Não confundir com as encenações gregas que visavam, através da dramatização, preparar, por exemplo, as crianças, para um amadurecimento saudável. Aqui, individualidades e anseios não eram respeitados. E ainda tem crítico que brada por aí que os autos de José de Anchieta são de orientação Vicentina. Seriam, se Gil Vicente, prematuramente, não ousasse questionar – o que importa se moralisticamente? – os mais diversos comportamentos sociais. Seriam, se Anchieta, corajosamente, produzisse textos engajados e compretidos com o seu tempo, como faria mais tarde, em seus sermões, o padre Antônio Vieira. Seriam, se o Brasil – a Ilha dos Papagaios – não fosse tão jovem e não se arrastasse às margens do Renascimento Cultural Europeu.

A supremacia do gênero lírico – durante os primeiros quatro séculos de vida do Brasil (leia-se Brasil oficial) – também atravancou de certa forma o desenvolvimento do gênero dramático no país. Se considerarmos que o gênero épico, a partir do século XIX, principalmente com o desenvolvimento do romance, cativava cada vez mais o público burguês, sobretudo o universo feminino, enxergaremos um teatro nacional tímido, que tenta despertar a atenção da burguesia fazendo-a sorrir da sua própria hipocrisia. Coube a João Caetano – e não a Martins Pena – numa época em que se encenava em barracões e tablados improvisados, profissionalizar o teatro brasileiro, através do incentivo ao mecenato e à subvenção estatal.

Já no século XX – sei que muitos ficam confusos assim como eu -, o descaso daqueles organizadores da Semana de Arte Moderna em relação ao teatro. Como é possível que um evento encenado (ironia cruel!) no Teatro Municipal de São Paulo, não tenha percebido a força da arte dramática enquanto grito de uma nova escola literária? Logo eles, os modernistas, que buscavam na realidade do cotidiano motivos de inspiração. Por que não foram capazes de, antropofagicamente, regastar os trabalhos de Tchekhov e de Antoine? De Stanislavski e de Meyerhold? Talvez porque não houvesse um dramaturgo entre eles. Antecipando-me a possíveis comentários a respeito da produção dramática de Oswald de Andrade, limito-me a explicar que as peças sequer foram montadas, senão décadas depois da fase combativa do movimento.

A partir dos anos 40 do século XX, a explosão. Bertolt Brecht, Tenessee Williams, Arthur Miller, Samuel Beckett, Jean Genet e Grotowski desdobram-se em Nelson Rodrigues, Jorge Andrade, Plínio Marcos e Ariano Suassuna. Em pleno século XXI, Ariano Suassuna, Plínio Marcos, Jorge Andrade e Nelson Rodrigues desdobram-se em tantos outros. Do Clássico ao Absurdo. Do Absurdo ao Clássico, o teatro brasileiro procura ainda (silêncio mórbido) construir uma identidade a partir de tantas outras identidades.