Infância

Infância

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Contagem Regressiva




Jeosá repousa sobre o tapete encardido da sala de jantar. Gatos gemem gemidos de prazer no maltratado jardim das flores mortas. Garfos e facas e pratos nervosos tilintam-tilintam-tilintam anunciando o passeio das almas.

Nem mesmo o desespero era capaz de aplacar a fome daquela mulher. Nem mesmo a estante (presente que dera ao filho) carregada de fracassos-troféus. A mãe de Jeosá devorava a carne e o arroz e o feijão como alguém que seria capaz de devorar a si mesmo. Esboçará algum esboço de reação ao encontrar a espingarda de canos duplos paralelos? Ao perceber o filho mergulhado na cama-piscina, afogado no próprio sangue?

Em algumas horas o professor de literatura estará no quarto. Sentadinho entre o guarda-roupa e a escrivaninha. Curtindo a derradeira noite. Aguardando a derradeira manhã. As velas. Oito olhos de escuridão. A espingarda de canos duplos paralelos. Tudo ajustadinho. Aquele crime perfeito que não fora elaborado até então.