Infância

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domingo, 3 de junho de 2018

Pequeníssima crônica da mediocridade





Felipe era mesmo um colecionador de pessoas. Cotidianamente alguma gente lhe despertava uma curiosidade quase vício. Não descobrindo de quem se tratava - é que muitas vezes encontrava-se no ônibus quando em uma calçada qualquer o potencial entrevistado transfigurava-se em sombra até finalmente desaparecer -, carregava para sempre aquela dúvida. Como não gostava de inventar histórias, tais personagens permaneciam em sua memória enquanto imagem contraditória: uma existência impossibilitada de existir.

Aos dez anos - primeiro fracasso - permitiu que escapulisse um senhor de barba branca, cabeleira branca, passos arrastados, um olhar que mais parecia nadinha de nada enxergar. À janela do quarto que desembocava na rua, não fora capaz de abordá-lo. Nenhuma das três vezes. Estático, apenas observava e se questionava a respeito das histórias armazenadas em cada fio grisalho. Chegou a pensar que estivesse diante do Papai Noel. Absurdo. Sentira-se mesmo um zé mané. Que morador do Polo Norte seria capaz de adaptar-se ao calor de Teresina? Passar rapidinho para distribuir presentes, até que vai, mais do que isso, coisa de gente abestada.

Felipe era mesmo um colecionador de pessoas tristes. Nunca se sentira atraído por um sorriso. Cabeças arribadas, peitos estufados e posturas resolutas soavam sempre falsas, senão vulgares. Descobrira, ainda na adolescência, o quão corajosos são os medíocres quando saem de casa. E, faceiros, desfilam de esquina a esquina, de quarteirão em quarteirão. Por isso os admirava e perseguia. Homens e mulheres. Constrangidos para constranger. Sem eles, como seria possível rabiscar a labiríntica face da existência?

sexta-feira, 2 de março de 2018

sábado, 3 de fevereiro de 2018

Fortuna



A Joseane


Se nem mesmo Goethe
Tão afeiçoado aos trejeitos de Mefistófeles
E Garrett                        
Profundo conhecedor
Do sofrimento romântico português
Selaram os olhos para o que lhes gritava o coração
O que dizer do pequenino poeta provinciano
Apaixonadinho (!)
Feito menino – não – feito velhinho
Diante de Ulrica – sua (?) Viscondessa da Luz. 


quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Janeiro Branco


Suicídio
  uicídio
    icídio
     cídio
       ídio
        dio
          io
          Ø

domingo, 14 de janeiro de 2018

Nietzsche


Ó anticristo

Ó espírito superior

Que a natureza e o instinto
Preservem ad infinitum
A idiotice humana
Apinhada de crenças imorais.


quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

O Assassinador - Filme Curta-Metragem



Os Teresinenses estão assustados. Cinco adolescentes, chamadas Maria, foram encontradas mortas às margens do rio Poti. Estaria o assassino imitando a lenda do Cabeça de Cuia?

Dante





Sabe o que me tranquiliza, Beatriz?
Quando estivermos mortos,
Tudo o que concebemos de ruim
Glorificar-nos-á.

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Fênix





Ah, se aquela nave
Ave doida
Doída
Sentida
Sentinela dos céus
Perdoasse o poeta
Profeta de si mesmo
Ou mesmo o infame exegeta
Da sarjeta habitante
Distante de ter sido
O tecido macio
O macho no cio
Cioso e inúbil.

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Por quê?



Minha mãe faleceu. Há quatro anos. Como esquecer o seu corpo quietinho. No chão. Do quarto. Embaixo da rede. Em contato com a madeira fria. O corpo frio. Mais parecia repousar. Às duas horas. Madrugada.

Durante alguns minutos apenas olhei para o corpo frio de minha mãe repousando ali embaixo da rede no chão frio do quarto. O grito de Vânia. Prima-irmã. Despertou-me. Levanta a mãe Nena. Pelo amor de Deus. Projetei-me. Levantei-a. Com alguma dificuldade. O corpo frio. Flácido. Dificultava o abraço. O último. Abraço.

E foi assim. D. Helena partiu. Morreu. Meu pai perguntava. De instante em instante. Eu respondia. Minha mãe descansou. Resignação. Mas o eufemismo não fora capaz de silenciar o desespero de Ícaro. Neto-filho. A notícia de que a avó já não cuidaria de tudo e de todos porque agora repousava fria em uma maca fria de um pronto-socorro frio explodiu em infinitos porquês.


Metáforas. Eufemismos. Hipérboles. Redundância. Desespero. Resignação. A morte de minha mãe. 5 de janeiro de 2014. Por quê?