Infância

Infância

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Querido Papai Noel...



O professor de literatura, passeando - ao meio-dia! - pela Frei Serafim, depara-se com um gigantesco Papai Noel. Diante do estranho velhinho - imitação grosseira de famosa estátua budista-, o homem (qualquer semelhança com aquelas cartinhas tão cheias de esperança será (?) mera coincidência) deseja:

Quisera eu permanecer estático assim como tu és sempre estático.  Quisera eu não sofrer porque o gesso não sofre. A tinta não sofre.  O olhar pintado em preto e branco nada mais é do que um falso olhar pintado em preto e branco. Quisera eu ter sempre as mãos quietinhas e resignadas. E as pernas entrelaçadas feito uma borboleta que nunca fora casulo e sequer desejou – um dia – voar.

Quisera. Eu. Não ser. Modelo psicanalítico de todas as pulsões. Quisera. Alienado. Desejar apenas o que está ao alcance das mãos estáticas. Dos desejos estáticos. Das pernas – borboletas vermelhas – também estáticas. Quisera eu não delirar. Não questionar. O que é o delírio? Fantasia que já não se concebe como tal. Neurose? Psicose? Deus sabe. A ciência sabe. Freud – limitado e preconceituoso – jamais será capaz de explicar. Ai, mitos, a arrogância apenas delimita e generaliza e enquadra.

E ninguém sabe de nada. Ninguém representado aqui enquanto alegoria. Ciência. Religião. Capitalismo. Visão maniqueísta e ultrapassada. Época em que o homem era bom. Época em que o homem era mau. E o bem e o mal - expressão antitética – jamais paradoxal – do homem inferior – porém egocêntrico – e universal.

Gutural. E rouco. E louco. E pouco atento àquilo, concepção conceitual, que se convencionou chamar de felicidade. Porque a felicidade nada mais é do que a fantasia de todos os homens. Nós. E enquanto fantasia jamais, materializada no real, será possível de nos fazer sentir realmente felizes. Felizes? Como se a experiência há tanto séculos já não proclamasse: insatisfação.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

A ti (2000)




Conheço grandes homens
Pequenos homens
Frustrados
Frustrações
São poetas desgraçados
São mulheres idealizadas
E nunca
Nunca
O tão sonhado amor
São versos fantásticos
Belas estrofes
E sempre
Sempre
A mesma dor
Mas conheço-te também
E questiono-me angustiado
Serei poeta?
Grande (?)
Pequeno (?)
Serei frustrado também?
Teus olhos
Uma ilusão
Teu rosto
A tranquilidade
Teu corpo
A satisfação
Não tocá-la
Minhas mãos
Não senti-la
Meus lábios
Não possuí-la
Meu coração
De que vale tanta poesia?
Sofro (sonho) tanto por ti!
Palavras?
Insignificantes.
Dizer não é justo lutar por ti
É tão blasfemo – encarar Deus
E duvidar do seu poder!
Dizer tentarei esquecer
É tão mesquinho – fechar os olhos
Quando é preciso encarar!
Ilusão
Tranquilidade
Satisfação
(Há contristação no ocaso)
Ilusão – olhos tão claros (caros)
Tranquilidade – ao teu lado
Satisfação – mulher ideal
Tocar e não tocar
Sentir e não sentir
Possuir e não possuir
Até quando?
Frustração (?).

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

A ti (2017)


Desejo-te, Lua, ao pôr do sol
(tal qual o pôr do sol).

Entre nossos signos
(satélite e estrela)
Há sublime fascinação.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Ficção e História


DUMAS, Alexandre. Os três mosqueteiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.


Logo na rubrica do prefácio de Os três mosqueteiros, Alexandre Dumas preocupa-se em esclarecer: (...) os heróis da história que teremos a honra de contar aos nossos leitores nada têm de mitológicos”. Ao considerarmos que o mito se sobrecarrega de elementos fantásticos, muitas vezes alegorias do Bem – aqui representado pelos mosqueteiros Aramis, Athos e Porthos, bem como pelo jovem aspirante a mosqueteiro d’Artagnan – e do Mal – materializado na figura do cardeal Richelieu -, perceberemos que o discurso do autor visa apenas conferir maior verossimilhança a uma obra repleta de personagens históricos envolvidos em situações fantasiosas.
A obra Os três mosqueteiros, enquadrada no rol dos romances históricos, opta por uma visão maniqueísta da sociedade francesa. O rei Luís XIII e sua esposa Ana da Áustria, vítimas constantes dos desmandos e tramoias do primeiro-ministro Richelieu, encontram em seus mosqueteiros, liderados pelo capitão sr. de Tréville, poderosos escudos contra os ataques de um cardeal preocupado – e tão somente – em desestruturar o casamento real, afirmando, por conseguinte, a sua própria autoridade.
A França da primeira metade do século XVII, período em que se desenrola a narrativa, era um país eminentemente católico. Ali, a Igreja exercia poderosa influência nos assuntos de Estado. Não é, portanto, coincidência que um membro do clero se converta em chefe de governo. E mais, longe de tentar enfraquecer o poder do rei, Richelieu foi, na verdade, o responsável pela consolidação do Absolutismo francês, assim fortalecendo o poder monárquico. Bem diferente da personagem que nos é apresentada por Dumas, o Richelieu histórico não pretendia desmantelar o reinado de Luís XIII, tornando-se ele mesmo um provável substituto. O primeiro- ministro sabia mais do que ninguém que em um regime monárquico o poder é transmitido de forma hereditária. Ao fortalecer a monarquia, o cardeal Richelieu deixa bem claro que, em sua ambição, melhor mesmo para a Igreja é permanecer ao lado de reis fracos e despreparados. Por que destronar, como é sugerido em diversas passagens de Os três Mosqueteiros? Melhor mesmo continuar manipulando. Eis o Richelieu histórico contrariando aquele Richelieu mesquinho – o primeiro-ministro construído por Dumas – constantemente envolvido em intrigas domésticas.
Ora, o romancista não é historiador, é ficcionista. E enquanto ficcionista livre das amarras engendradas por uma suposta verdade histórica. Suas personagens são o que são, maravilhosas como são, justamente porque alcançam possibilidades que nenhum historiador ousará vislumbrar; possibilidades que brotam da fertilíssima terra da imaginação.

RESENHA APRESENTADA À DISCIPLINA FICÇÃO E HISTÓRIA, MINISTRADA PELO PROF. DR. FABRÍCIO FLORES (MESTRADO ACADÊMICO EM LETRAS-UESPI)

segunda-feira, 18 de setembro de 2017



Criança de 10 anos sofre violência doméstica. A mãe, que também é agredida pelo marido, não protege a filha. Já que não consegue defender-se das agressões, a menina desenvolve uma estrutura psicológica que desdobra o seu ego em seis outros egos: 4 meninas e 2 meninos. Juntas, as “7 crianças” tentarão sobreviver.

Direção e Roteiro: Ajosé Fontinelle @ajose1150
Imagens e Edição: Ícaro Uther @icaro.u
Produção: 1150 Produções
Elenco: Psicoatores
Apoio: Colégio CPI | Grupo Hot Sat

Curta: www.fb.com/1150producoes

Teresina-PI, Setembro de 2017


segunda-feira, 31 de julho de 2017

Simulacro


Entre a máscara e o rosto
Há sempre uma outra coisa,
Também máscara, também rosto,
Posto que indistinguível:
Se máscara, rosto, um vulto qualquer.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Ataúde (repostagem)



O espelho reflete o reflexo do reflexo do poeta
O poeta não enxerga a si mesmo
O que se imagina ser o poeta é apenas sombra

Distorcendo as paredes alvas que amparam o altar
Umidade escorrendo - entrededos - pelos corredores vazios
Sinos de angústia anunciando a derradeira procissão.






quarta-feira, 5 de julho de 2017

Diário de um professor que também pretende ser ator



Ministrei aula para a Brisa (maravilhosa cacofonia), contracenei com a menina Serena e conheci a professora Purificação. Admito: finalmente uma semana auspiciosa. Então, então.

domingo, 4 de junho de 2017

De Arnaldo Antunes, Nome



NOME. Direção: Arnaldo Antunes. Realização: Arnaldo Antunes, Celia Catunda, Kiko Mistrorigo e Zaba Moreau. BMG Brasil, 1993. 1 DVD (50MIN), color.

            Concentrarei a minha análise da produção audiovisual Nome, de Arnaldo Antunes, na intersignificação e possíveis relações das três matrizes semióticas da literatura e das artes, assim considerando aspectos verbais, não verbais e acústicos. Esclarecendo que o objetivo do texto não é resenhar criticamente o vídeo, mas sim realizar uma série de inferências semióticas a partir do mesmo, enquanto material rico em elementos verbais, visuais e acústicos.
            O poema Fênis é construído com apenas duas palavras, fênis e pênix. Esses dois significantes, carentes de significado, remetem o leitor, pela sonoridade e semelhança, aos significantes pênis e fênix, estabelecendo uma aproximação entre a genitália masculina e o pássaro mitológico, afinal ambos desfalecem e renascem constantemente em busca do gozo, entre sussurros e gemidos enfatizados pela sonoplastia.
            Ícones de vários animais desfilam pela tela, no poema Cultura, enquanto se ouve as seguintes afirmativas: “o girino é o peixinho do sapo”, o bigode é a antena do gato”, “as raízes são as veias da selva” etc., ampliando a possibilidade de significados ao considerar aspectos visuais dos respectivos significantes (girino=peixinho/bigode=antena/raízes=veias).
            Já em poemas como Soneto, a forma fixa da composição desfaz-se graças a uma câmera nervosa que passeia pelo texto, permitindo que o leitor reconheça apenas uma ou outra palavra, numa espécie de passeio subjetivo pela objetividade (seleção vocabular, métrica e rima) da construção de um soneto. Também encontramos uma solução visual interessante no contraponto entre “já passou”, “agora” e “outro” e flashes de imagens as mais variadas, em um claro exemplo de pleonasmo estilístico.
            Finalmente, para citar apenas mais um poema, dos trinta que compõem a obra, partes do corpo (axilas, bocas, pentelhos e mãos) em plano detalhe assemelham-se às genitálias masculina e feminina, reforçando o conteúdo fescenino de um poema que em seu primeiro verso anuncia: “o olho enxerga o que deseja e o que não”.

Texto apresentado à disciplina Semiótica da Cultura, ministrada pelo Prof.º Dr.º Feliciano José B. Filho, Mestrado Acadêmico em Letras, UESPI. 


            

segunda-feira, 29 de maio de 2017

Falácias Intencionais



Muito já se escreveu a respeito da produção literária do prosador piauiense Orlando Geraldo Rego de Carvalho (1930-2013). Na tentativa de melhor compreendê-lo, pesquisadores chegaram mesmo a desnudar a intimidade do ficcionista oeirense. Obcecados em desconstruir, para depois reconstruir didaticamente, a angústia, o medo e a ansiedade, características tão presentes em suas personagens, esses mesmos estudiosos concentraram-se no autor, confundindo-o com o narrador, e decidiram primeiro analisar psicologicamente o próprio artista.
Considerada inacessível e até mesmo indesejável, a intenção do autor não deve ser utilizada como referência no momento de se julgar a eficiência de uma obra de arte literária. Compreendendo a intenção como mera pretensão de um escritor, não seria precipitado admitir o seu êxito apenas realizando uma espécie de adivinhação do que o artista sentia e pensava no momento da escritura? E mesmo havendo a possibilidade de se entrevistar qualquer escritor, não há garantias que ele tenha sido bem sucedido em sua intenção.
            Mesmo que estudos biográficos sejam pertinentes, um dos resultados, quando O. G. Rego de Carvalho é o autor em questão, é um desfile heterogêneo, algumas vezes irresponsável, das mais diversas abordagens psicológicas. Há pesquisas, por exemplo, que identificam que sua escrita não pode ser desvinculada das relações familiares. Por sua vez, Wintsatt; Beardsley (2002, p. 642) são coerentes ao alertar: “Devemos atribuir os pensamentos e atitudes do poema de imediato ao falante dramático e, se de algum modo ao autor, apenas por um ato de inferência biográfica”. Esclarecem assim que o texto, emancipado de seu escritor, também longe de pertencer ao crítico, é propriedade, em suas andanças pelo mundo, do público, que a acolhendo, certamente a perpetuará. Afinal, parafraseando os autores citados, a obra extrapola aspectos intrínsecos do escritor. No máximo, vislumbra-se uma afinidade entre autor e narrador:

O emprego da prova biográfica não precisa envolver a intencionalidade, porque, enquanto pode evidenciar aquilo que o autor pretendia, também pode evidenciar o significado de suas palavravas e o caráter dramático de uma elocução (WINTSATT; BEARDSLEY, 2002, p. 647).

  As atitudes do narrador não podem ser explicadas considerando-se a vida pessoal do autor, pois estaria, assim, arriscando-se o crítico a envolver-se em uma falácia intencional.
Faz-se necessário, então, compreender que Ulisses, narrador homoautodiegético de nível intradiegético de segundo grau, protagonista e herói da novela Ulisses entre o amor e a morte, e O. G. Rego de Carvalho não são a mesma pessoa, mesmo que tenham vivido nos mesmos lugares e passado por experiências afins.


REFERÊNCIAS:

CARVALHO, O. G. Rego de. Ulisses entre o amor e a morte. Teresina: Corisco, 1999.

WINTSATT, Willian Kurtz; BEARDSLEY, Moroe Curtis. A Falácia Intencional. Trad. Luíza Lobo. In: LIMA, Luiz Costa (Org.). Teoria da Literatura em suas fontes. Vol. 2. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 639-656.



Texto apresentado à disciplina Literatura: Perspectivas Críticas e Culturais, ministrada pela prof.ª Dr.ª Maria do Socorro Baptista Barbosa, Mestrado Acadêmico em Letras.

segunda-feira, 22 de maio de 2017

Ulisses



Resumo referente ao artigo Os elementos auto-representativos na novela Ulisses entre o amor e a morte, de O. G. Rego de Carvalho, que faz parte do livro Geografias Literárias: confrontos: o local e o nacional, organizado por Francisco Venceslau dos Santos, com a colaboração de Raimunda Celestina Mendes da Silva.


            O conceito de narração para uma obra fictícia extrapola a simples exposição, afinal envolve momentos interdependentes que são o começo, o meio e o fim, organizados pelo narrador, primeiro protagonista da comunicação literária. Na novela Ulisses entre o amor e a morte, de O. G. Rego de Carvalho, o discurso, em primeira pessoa com apoio na terceira do singular, é assumido pelo narrador de forma explícita. O ponto de vista é de um “eu” narrador homoautodiegético de nível intradiegético de segundo grau, misturando sensações presentes com um passado resgatado através de lembranças bem vívidas. Ulisses, o protagonista, é herói e narrador ao mesmo tempo, enquanto as cidades de Oeiras e Teresina funcionam como ponto de identificação tanto do espaço discursivo quanto do tema narrativo. A primeira parte da narrativa (infância) revela, através do discurso, o cotidiano do protagonista em Oeiras, enquanto a segunda parte (adolescência), apresenta acontecimentos não-habituais de uma vida nova em Teresina. O que se constata, independente do espaço geográfico, é que a descrição dos acontecimentos é uma projeção exterior do estado psicológico do narrador protagonista. Vale ressaltar que O. G. Rego de Carvalho utiliza-se de um narrador puro, consciente de que entre o mundo da realidade histórica e do imaginário há apenas analogias. Considerando o campo discursivo, destaca-se em Ulisses entre o amor e a morte, a linguagem, em padrão culto, e a estrutura bem curta dos capítulos. Pode-se afirmar que o sujeito do discurso produziu um texto que permite a mímese da representação, ao ativar os dois níveis do princípio mimético: recepção e produção. Ocorre, por exemplo, uma relação de verossimilhança com a realidade exterior do texto, quando Oeiras e Teresina operam como unidades pensáveis em uma realidade referencial, quando também o narrador constrói plasticamente uma cena através da representação verbal. O habitat natural do narrador assemelha-se à realidade exterior do texto, o que permite que o receptor identifique o modelo que está sendo utilizado. Se a realidade numa obra literária é a vida que o autor consegue captar e colocar à disposição do leitor, O. G. Rego de Carvalho assim a realiza por intermédio do sentimento de seus personagens, à medida que recria a geografia oeirense e teresinense, utilizando-se de sua real experiência de vida. Na novela ogerreguiana protagonista e leitor completam-se, o primeiro observando a realidade concreta, o segundo recebendo percepções dessa mesma realidade. Assim, em Ulisses entre o amor e a morte, o autor, ao privilegiar aspectos sociais e individuais, conduz, inevitavelmente, o leitor a uma reflexão a respeito dos assuntos abordados.

VIANA, Márcia Edilene Mauriz. Os elementos auto-representativos na novela Ulisses entre o amor e a morte, de O. G. Rego de Carvalho. In: SANTOS, Francisco Venceslau dos (Org.). Geografias Literárias: confrontos: o local e o nacional. Rio de Janeiro: Editora Caetés, 2003. p. 33-55.

Texto apresentado à disciplina Metodologia da Pesquisa em Literatura, ministrada pela Prof.ª Dr.ª Raimunda Celestina Mendes da Silva, Mestrado Acadêmico em Letras, UESPI.


quinta-feira, 18 de maio de 2017

1,99 – Um supermercado que vende palavras



Logo no início do filme de Marcelo Masagão, deparamo-nos com uma personagem empurrando um carrinho de supermercado. É possível perceber também produtos, identificados por palavras ou números, dispostos em prateleiras. Ora, o carrinho, os produtos e as prateleiras combinados - ícones organizados por similaridade - remetem-nos imediatamente ao título da produção cinematográfica: 1,99 – um supermercado que vende palavras.

Há uma nítida transposição de conceitos e caracteres denotativos e conotativos - tão familiares à linguística - para o cinema, enquanto sistema de signos. Mas também há, por parte do roteirista e do diretor, a consciência da importante ligação entre as linguagens verbal e não verbal, e uma nítida valorização do representante, quando instigam o público, no processo de compreensão da obra, a romper com a dualidade significante/significado.

Aquele supermercado não é qualquer supermercado. Ele vende palavras. E não são as palavras símbolos autênticos? Por isso mesmo, nos primeiros minutos do filme, o público, antes de acomodar-se diante da obra, passeará pelo fenômeno das categorias peirceanas, sejam elas: primeiridade, secundidade e terceiridade, compreendendo assim que a construção da interpretação, longe de ser arbitrária, é racional e dialética.

O leitor incapaz de identificar imagem e diagrama, subclasses peirceanas do ícone, no filme de Masagão, não estabelecendo assim uma relação entre significante e significado e seus respectivos desdobramentos conotativos, dificilmente compreenderá quem são – ou o que representam – aquelas pessoas cercadas de pneus velhos em um depósito carente de palavras, para citar apenas um exemplo.

Assista ao filme:

https://www.youtube.com/watch?v=vSmuy5ZHBlU&list=PL62B784873F936B8F

Texto apresentado à disciplina Semiótica da Cultura, ministrada pelo Prof.º Dr.º Feliciano José B. Filho, Mestrado Acadêmico em Letras, UESPI.


domingo, 7 de maio de 2017

A Terceira Margem do Rio



O título do conto de Guimarães Rosa já provoca certo estranhamento. O que seria essa fantástica terceira margem? Considerando-se signo a substituição ou representação de uma coisa por outra, em que consistirá aquela metáfora? Será o pai, homem quieto, levando ao extremo o isolamento? Ou o próprio rio naquele pedaço de substância que não chega a tocar as margens direita ou esquerda? O que substitui o quê?

Para melhor organizar a breve análise que em momento algum pretenderá alcançar a irrelevante intenção do autor, valho-me da seguinte afirmativa de Paul Válery: “Não há verdadeiro sentido de um texto”, para logo em seguida, dessa vez citando Todorov, “O autor entra com as palavras e o leitor com o sentido”, ratificar a ideia de que a infinitude de significados de um texto não resultará, sobremaneira, em interpretações medíocres.

Os signos como passam a ser trabalhados pelo autor, numa combinação inédita, lançam um novo signo: pai e rio tornam-se uma outra coisa, provocando assim uma necessidade de estudo e compreensão daquela nova verdade, até - parafraseando Jung - tornar-se familiar demais, perdendo assim todo o mistério. Quando, finalmente deixaremos Guimarães Rosa em paz, um homem dentro de uma canoa em um rio será apenas um homem dentro de uma canoa em um rio.


Texto apresentado à disciplina Semiótica da Cultura, ministrada pelo Prof.º Dr.º Feliciano José B. Filho, Mestrado Acadêmico em Letras, UESPI.