Infância

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domingo, 8 de novembro de 2009

Mãe Dete



Tia Odete faleceu. Não pude velar o seu corpo. Nem mesmo acompanhá-la ao cemitério. Também não assisti ao desaparecimento do caixão no momento em que a areia preenchia a sepultura. Muito menos ouvi os lamentos das tias (Como é possível conviver a vida inteira com uma pessoa e, repentinamente, perdê-la?). A pergunta, aos prantos, é inevitável: Por que, meu Deus?

Também não estarei presente quando da leitura desta crônica. Quantas vezes não deixamos de prestigiar aqueles que amamos por estarmos ocupados demais? Quantas vezes nos afastamos quando alguém precisava apenas de um pouquinho de atenção? Quantas vezes fomos egoístas e mesquinhos quando o mais sensato era olhar para o próximo e distribuir, feito pétalas de rosas, todo o carinho de que necessitava?

Tia Odete era uma mulher forte. Não se aquietava jamais. Constantemente aqui e acolá. Era também de uma sinceridade peculiar. Olhava-nos nos olhos e disparava (Tiro certeiro!) o que sentia e pensava. Não deu à luz filhos. Mas deixou órfãos irmãos, sobrinhos e amigos. O que esperar, se não caridade, de uma mulher que, juntamente com as irmãs, abriu mão da própria vida (conquistas e sonhos) para cuidar dos pais? Imagino o vovô Zé Felipe e a Vovó Zulmira abraçadinhos com a filha querida. Retribuindo o carinho e a atenção. Explicando que ali é o Céu. Preparando mãe Dete para uma nova “vida” repleta de felicidade.

Há algumas semanas estive com ela. Conversamos bastante. Até sorri, ela também sorria, de algumas histórias, resultado da confusão mental em que se encontrava. Em sua doença, estava tranquila. Serena. Não havia revolta em suas palavras. Nem desespero nas atitudes. O olhar transmitia uma meiguice que impressionava. Em seus últimos momentos, recebeu de Deus o sossego enquanto presente. Resignada, aceitou a morte. Encarou a morte. Recebeu a morte, oferecendo-lhe a melhor cadeira. E deixou-se levar. Com a dignidade de quem soube viver. Com a dignidade de quem também sabe morrer.