Infância

Infância

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Percussão


Tambores.

Pés pesados contra o chão de terra batida. Contorce-contorce de corpos espalhando-se (espelhando-se) pelo salão. Uma gritaria-gemido maltratando as cordas vocais de fêmeas descontroladas. Olhos salientes-silentes enxergando o que não há.

Tambores.

Mãos naquele movimento vertical-horizontal-vertical de não parar jamais. Torsos despidos-suados pulsando agitados balouçando colares. Cabeças-pescoços-membros descompassados e febris. Enquanto fumaça e vermelhidão embotam o tino-senso-juízo da gente-turbilhão.

Tambores.

Menina esquálida-deitada-amarrada. Apenas um fio de pano esconde (não esconde) a vulva e os pêlos dourados. Mamilos rijos-firmes-enormes encaram a cara de seus agressores. Pernas arqueadas-surradas-esfoladas. Braços sem ânimo. Sem vida. Sem nada. Correntes de carne na carne cansada.

Tambores.

Batuque-batuque. Aroma-aroma. Sabor-sabor. Ofusca-ofusca. Calor-calor. Rasgando o corpo da menina esquálida-deitada-amarrada, eis que emerge - a partir do diafragma - uma velhinha simpática-tranquila-apática. Sequer percebe que aquele estranho parto separou de vez o tórax e o abdome da adolescente.

Tambores.

Os sentidos captam a morte da menina esquálida-deitada-amarrada. Há um batuque-batuque. Aroma-aroma. Sabor-sabor. Ofusca-ofusca. Calor-calor de ruína no ar. Agora a cuiambuca cheinha do sangue da virgem-menina alimenta a gente-indolente – gotas de vermelho nos lábios. Nas mãos. Nas roupas. No chão.