Infância

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quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Infantilidade



Há alguns anos passear pelas ruas de Parnaíba – pilotando uma barra circular vermelha (sem garupa!) – era uma tarefa cotidiária prazerosa. Afinal, transportar as namoradas no confortável (ironia!) varão da bicicleta rendia lá suas recompensas: cheirinhos e beijinhos no cangote da moça... roçar de joelhos no bumbum macio, nas coxas macias... (sensação maravilhosa de não dever nada a ninguém).

Senti-me invadido por essas lembranças graças a um encontro com certo aluno do ensino médio. Ao entrar em um ônibus, na Miguel Rosa (atualmente moro em Teresina), fui recepcionado com o seguinte comentário: professor ganha pouco mesmo... cadê o carro, Ajosé? O carro estava na oficina. Revisão de final de ano. Foi o que respondi. Rapidamente. Precisamente. Indignado. Não com o questionamento do aluno. Com o medo que me invadiu a alma de ser confundido, naquele instante, com alguém que precisa “pegar” ônibus todos os dias. Devo, inclusive, ter acrescentado: espero receber logo o MEU CARRO. Tom de saudade na voz: não vejo a hora de estar, novamente, com o MEU CARRO. Um pouco de esperança: amanhã, se Deus quiser, a oficina entrega o MEU CARRO.

O que eu não sabia, até então, incomoda-me demasiadamente. Em que(m) me transformei? Em que pedacinho do universo ficou perdida a humildade, sustentáculo do que havia de melhor em mim? Desde quando me tornei arrogante? Não será arrogância, prepotência, atrevimento – demência! -, sentir vergonha de estar aqui ou acolá? Estarei ensinando para os meus filhos tamanha imbecilidade? Serei professor de lições perigosas como as que assimilei, mesmo que subliminarmente?

Ainda não sei. Sei bem muitas outras coisas. Tipo: não desperdiçarei tempo precioso da minha vida reprimindo o que há de verdadeiro em mim. E o que há de verdadeiro em mim é aquela criança que perambulava pelas ruas do bairro Nova Parnaíba. Gritando. Cantando. Amando cada tiquinho de sonho materializado em experiências inesquecíveis. É aquela criança da Vieira da Cunha, sempre indignada com qualquer possibilidade de preconceito e discriminação.

3 comentários:

Unknown disse...

Belo texto. Puro.Verdadeiro.Questionador.Inquietante.Probo.Amei!!!!

Joseane Pinto

Anônimo disse...

Eu penso que quando crescemos interiormente - o que nem sempre acorre numa relação direta e proporcional com o exterior - nos tornamos capazes de questionar a nós mesmos. Sócrates, com o seu famoso "Conhece-te a ti mesmo" já, na Grécia Clássica, nos apontava esse caminho...

Quanta emoção existe em "Infantilidade". Emoção que, conjugada com racionalidade, não nos deixa esquecer o quão "infantis" somos (estamos) todos nós.

Margareth Reis

Unknown disse...

nunca imaginei q o meu comentario naquela manha fosse valer tanto...