Infância

Infância

sábado, 22 de outubro de 2011

Da infância


Jeosá é o menino que brincava menino na época de eu menino. Jeosá e sua espingarda de canos duplos paralelos. Jeosá suicídio. Jeosá resquício de memória - lembrança distorcida de uma pseudoinfânciafeliz. Cadê meu filhote lindo chamado Dedé? Estou aqui, minha mãe. Arrebentado. Chorando espectros de lágrima. Arrependido de estar machucado e de não poder desfrutar daquele carinho gratuito – espécie de bônus por não ter aprontado deveras tanto quanto deveria.

Quando a Monareta sobrevoou o calçamento, arremessando Jeosá e o que ainda havia de esperança em Jeosá, a consciência da efemeridade do ser e das coisas e de um presente de aniversário configurou-se tatuagem em meu estômago rubro. O sangue-insônia era o sangue derramado pelos meus pais. A bicicleta-troféu não era prêmio. Era sacrifício. Agora disforme. Tal qual a alma de Jeosá.

A alma de Jeosá é uma bicicleta cuja roda dianteira não é mais capaz de rodar.

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