Infância

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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Progênie


Permanecer triste. Quando se tem tudo o que sempre sonhou. Encarar a vida. Incerteza. Estremecer diante da eventualidade do amanhã. Questionar-se a respeito do ser. Do não ser. Permanecer atento a tudo aquilo que provoca dor.

Jeosá refletia. Há sete horas. Imóvel. No cantinho à direita do computador. Pensou. Pela primeira vez. Na espingarda de canos duplos paralelos. O enforcamento não era mais uma possibilidade. Idiotice. Torcer. Retorcer. Contorcer. Lençóis encardidos. Tolice. Sufocar. Abafar. Asfixiar. Lençóis bordados. O rubro nome de Joane.

Comprará muitas velas. Dias depois. Mil velas espalhadas pelo quarto. O fatídico dia. Mil pequenas línguas de fogo. O professor de literatura. A espingarda de canos duplos paralelos. Aquele aperto no peito de quando criança. Aflição inexplicável. Insistente. O coração. Instrumento desafinado de percussão.

Por enquanto. À direita do computador. Entre a escrivaninha e o guarda-roupa. Jeosá ouve os conselhos arrastados das três sombras. É a terceira visita. Em três semanas. Falam ao mesmo tempo. Mas o professor distingue cada uma delas com habilidade impressionante. Cada palavra é uma idéia. Cada idéia uma suposição. Cada suposição um caminho a ser explorado. Ao final de cada caminho. A espingarda de canos duplos paralelos.

Ouviu os pés pesados da mãe. Levantou-se. Voltou a digitar. A mãe entrou sem pedir licença. Deitou algumas roupas sobre a cama. Retirou-se. Não percebeu as lágrimas. As mãos trêmulas. A respiração cansada. Não percebeu o filho. Ali na escrivaninha.

2 comentários:

Anônimo disse...

Palco da vida

"(...) Ser feliz não é apenas valorizar o sorriso, mas refletir sobre a tristeza (...) é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise (...) é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um 'não'(...) é deixar viver a criança livre, alegre e simples que mora em cada um de nós (...)." (Fernando Pessoa)

Sempre me calarei para Jeosá. Afinal, o que dizer? Mas, sempre, sempre desejei falar a Ajosé, um homem tão apaixonado pela vida que a toma como palco, e continua, através de muitos dos seus textos, sendo a criança que grita, corre, pula, chora, sofre e precisa da atenção de todos, especialmente da mamãe!

Margareth Reis

Unknown disse...

jeosá
a josé...
tambem gosto de brincar com nomes...
suicidio é como dar um salto no escuro, é um risco grave... mas se existe um céu como recompensa talvez jeosá deva arriscar.